Publicado em 16/04/2013, às 21h00 - Atualizado em 31/08/2021, às 14h56 por Redação Pais&Filhos
Matheus Monteiro, filho de Leonice e Edimar
As alterações hormonais, a louca variação de emoções e a brusca mudança na rotina explicam a ligeira tristeza que é comum depois do parto – e que é normal e passa rápido. Só que às vezes ela não é tão ligeira assim. Depois de chegar em casa com seu recém-nascido, você chorou mais que ele sem explicação, não teve mais ânimo pras atividades que gostava e não sentiu vontade de amamentar. Se isso durou mais de três semanas, pode ser a famosa depressão pós-parto, uma doença que atinge de 10 a 20% das mulheres que dão à luz no mundo inteiro, e que não tem apenas uma causa. Mas não há motivos para culpa.
Qualquer mulher pode enfrentar esse problema, em qualquer lugar e em qualquer gestação. E não tem nada a ver com você gostar ou não do seu filho. A questão é se cuidar. Ao perceber os sinais, procure ajuda médica especializada, siga o tratamento e busque na relação com o seu bebê a força para seguir adiante e acompanhar a infância dele.
Depressão não é tristeza
Durante a gravidez, as alterações hormonais são bastante comuns para promover as mudanças no corpo necessárias à gestação, ao parto e à amamentação. E você, como toda mulher, sabe que alta e baixa de hormônios afetam muito as emoções; basta se lembrar de cada TPM enfurecida. No pós-parto, a sensibilidade fica ainda maior para criar um clima em que você se sinta bastante próxima do seu filho, para entendê-lo e protegê-lo. “A mulher precisa estar completamente disponível para conhecer e interpretar as necessidades do bebê, e esse estado envolve condutas não usuais para ela, como ficar mais sensível”, explica a psicanalista Alessandra Gordon, membro da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.
Nesse processo de aprender a ser mãe, alguns dias serão melhores, enquanto outros serão mais difíceis. E isso é normal. A tristeza pós-parto – chamada de baby blues –, inclusive, é experimentada por até 80% das recém-mães, durante, no máximo, 15 dias após o nascimento da criança. Afinal, um pouco de angústia diante do “e agora?” pode acontecer.
A depressão pós-parto porém, é um estado mais grave, e que oscila. Nela, depois de aproximadamente três semanas, os sintomas da tristeza continuam muito fortes e começam a interferir enormemente no seu dia a dia, no do bebê, e até no de outras pessoas.
Surge um desânimo e uma apatia para essa nova realidade cheia de novidades, renúncias, conflitos, mas que também é repleta de alegrias e conquistas – que você, infelizmente, não consegue enxergar.
Os sintomas são os mesmos da depressão “comum” (veja o quadro na página ao lado), com o agravante de que, de um lado, está um bebê que precisa ser cuidado, e, do outro, você deprimida e incapaz de dar a atenção necessária de higiene, alimentação e afeto. É hora de procurar ajuda, e de várias pessoas.
“A primeira atitude a ser tomada é procurar o médico obstetra e, então, um psiquiatra”, alerta a ginecologista Arícia Galvão, membro da Associação dos Obstetras e Ginecologistas do Estado de São Paulo, filha de Laerte e Maria Helena. E quanto mais cedo melhor. A questão é ficar atenta aos sinais, que podem aparecer até antes do nascimento.
Uma pesquisa feita por médicos da Universidade de São Paulo (USP) e publicada na Revista Brasileira de Psiquiatria no mês de março revelou que cerca de metade das mulheres que têm depressão pós-parto já apresentava os sintomas durante a gravidez. A atenção aos próprios sentimentos é fundamental para o diagnóstico precoce e um tratamento eficaz.
Cuidando de si
O tratamento precisa da psicoterapia, mas também pode necessitar de remédios. “Em casos mais leves e descobertos precocemente, a psicoterapia basta, e é fundamental para a mulher. Em casos mais graves, porém, é indispensável o tratamento com remédios, receitados pelo psiquiatra, aliado às orientações do obstetra e do pediatra”, indica a psicóloga Rafaela Schiavo, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia, filha de José Luiz e Maximina. Segundo ela, a psicoterapia é importante para a compreensão dos conflitos psicológicos que geraram o quadro depressivo.
O apoio familiar também é essencial. Seu marido, seus pais, ou alguém muito próximo, devem te ajudar nas tarefas cotidianas. Escolha alguém que possa te acompanhar e te valorizar, sem criar qualquer conflito psicológico. Não tolere, de forma alguma, críticas a você e à situação em que está vivendo. “A família e os amigos devem ajudar a mãe a perceber que ela não está bem e incentivá-la a ver que tudo vai passar. Depois, encaminhá-la para o tratamento médico e, sobretudo no começo, se apropriar dos cuidados com o bebê. O pai presente é fundamental”, diz a psicóloga Pompéia Villachan-Lyra, filha de Ângela e Lira.
No caso da jornalista Fabiana Faria, mãe do João Vitor, durante a depressão pós-parto que viveu, a ajuda veio de uma diarista. “Meu ex-marido segurou uma barra, e meu pai e minha irmã me ajudaram dentro do que podiam. Mas minha faxineira foi a pessoa mais linda deste mundo. Ela virou mensalista por alguns meses, até eu melhorar. Teve a maior paciência, nunca me julgou e me ensinou a ser mãe. Ela ainda arrumou uma babá superdivertida que me fazia companhia na madrugada – a pior hora pra mim”, conta. Ela percebeu que estava doente uma semana após o parto, e, no aniversário de 1 ano do filho, estava ótima. “Demorou um pouquinho pra eu virar mãe, mas consegui”, comemora emocionada.
Ao responder ao tratamento, a mãe vai adquirindo o desejo e o prazer de cuidar do filho. Mas, sem ajuda profissional, o quadro pode se agravar e levar a tentativas de suicídio e ao abandono do bebê. De acordo com o pediatra Adauto Dutra, filho de Lair e Cléia, e membro da Sociedade Brasileira de Pediatria, se não for tratada, a depressão pós-parto gera uma ruptura precoce na relação afetiva familiar, o que acarreta problemas futuros. “A doença que persiste por anos pode influenciar decisivamente no desenvolvimento fisiológico da criança, ao privá-la de suas necessidades afetivas básicas”, explica. Cuidar de você mesma, então, é a principal maneira de eliminar a dor, a doença e a culpa, para, então, passar a cuidar de seu filho com o carinho e atenção necessários.
Fatores de risco
Alguns fatores podem contribuir para o surgimento do problema. Históricos de depressão – pós-parto ou não – te dão mais chances de apresentar a doença, ainda mais se os conflitos psicológicos não foram tratados adequadamente.
Além disso, gravidez não desejada ou planejada, a experiência de algum aborto, violência doméstica e outros fatores externos que causam aumento do estresse ao longo da gestação também podem contribuir.
A prevenção acaba sendo difícil, mas a redução dos riscos é possível. “O que pode ser feito é olhar para os fatores predisponentes. Uma boa educação sexual, na qual se ensine à mulher e ao homem como prevenir a gestação diminuiria muito a ocorrência de gravidez indesejada. Apoio social e das próprias famílias também reduziriam em muito a ocorrência tão grande do fenômeno”, alerta o psicólogo Roberto Banaco, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia e pai da Marina, Adriano e Mauro.
O problema não está relacionado à quantidade de amor que você tem por seu filho. Lembre-se que os bebês são muito sensíveis, mas, paradoxalmente, muito fortes. “Cuide de si mesma com a perspectiva de que o amor e a constância que não puderam ser experimentados plenamente desde o nascimento da criança ainda podem ser vividos, enquanto ambos – mãe e filho – estiverem se relacionando”, orienta a psicanalista Alessandra. “Hoje, vejo esse período como um tempo de aprendizado, e digo para quem se encontra com depressão pós-parto que é fundamental se deixar ajudar e não se entregar à situação”, aconselha a administradora Soraia Lopes, mãe de Júlia e José, que teve a doença na segunda gravidez e hoje está superbem. Saber da possibilidade de acontecer com você é o primeiro passo. O segundo e o terceiro são receber o tratamento certo e aprender que a culpa não é sua.
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