Publicado em 30/08/2013, às 13h16 - Atualizado em 06/11/2020, às 07h46 por Redação Pais&Filhos
Você pode ter ouvido muitas vezes aquela conversa sobre o quanto o ambiente em que as crianças crescem interfere em seu estado psicológico e emocional para o resto da vida. É uma teoria antiga que, agora, mais do que nunca está sendo acreditada – e comprovada – pela ciência. Novas revelações da neurociência confirmam a importância do ambiente para os processos neurocognitivos e emocionais na capacidade de aprender e, mais do que isso, neurocientistas acreditam que muitos distúrbios e dificuldades de aprendizagem vêm de processos emocionais difíceis, comprometendo o que chamam de ‘sinapses de aprendizagem’ ou pontes neuropsicopedagógicas. O papo parece difícil, mas é menos complicado que se imagina: os cientistas defendem e provam como a emoção é quase tudo no processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Segundo a educadora especialista em psicopedagogia e neuropsicologia, Adriana Foz, filha de Tolita e Cícero, o desenvolvimento emocional saudável resulta no desenvolvimento completo do ser humano. E isso acontece especialmente nos primeiros anos de vida, até os 10 anos. É durante nossos primeiros anos que formamos nossa grande estrutura emocional, sendo, portanto, bastante importante cuidar dos afetos da criança e do ambiente em que ela cresce, já que isso vai interferir em características futuras: inclusive se ela vai desenvolver dificuldades na hora de aprender ou conviver socialmente.
Segundo a especialista, muitos dos problemas de infelicidade e insatisfação, por exemplo, são frutos de problemas emocionais passados – da criança que fomos. “E isso não é empírico, é neurocientifico: ou você desenvolve recursos na primeira infância ou fica muito difícil mudar depois. Um dos exemplos simples para entender essa relação é nossa formação da língua materna, que ocorre até os 10 anos. “Depois de 10 anos, não teremos uma outra língua materna. Podemos aprender, mas não a desenvolveremos como nativa. E é assim com quase tudo na vida”, explica Adriana.
Cognição significa a aquisição de um conhecimento através da percepção, é o conjunto dos processos mentais usados no pensamento e na percepção, também na classificação, reconhecimento e compreensão para o julgamento através do raciocínio para o aprendizado de determinados sistemas e soluções de problemas. Simplificando, podemos dizer que cognição é a forma como o cérebro percebe, aprende, recorda e pensa sobre toda informação captada através dos cinco sentidos. Para demonstrar a influência do emocional no aprendizado cognitivo os neurocientistas têm usado as ideias da epigenética.
Parece complicado. Bom, e de certa forma é mesmo. A epigenética não é um estudo recente, mas vem se tornando importante no cenário científico nos últimos dez anos com novos estudos que dão força às teorias. Estuda-se a influência do ambiente na modificação do nosso DNA e, mais do que isso, os cientistas dessa área defendem que existe uma “herança epigenética”, ou seja, características que passamos aos nossos filhos que foram adquiridas por nós no meio ambiente. Os estudos mais sérios sobre o assunto são realizados nos Estados Unidos: por lá, os cientistas já notaram que crianças nascidas de mulheres que presenciaram o 11 de Setembro demonstram mais chance de desenvolver estresse. E que filhos de fumantes têm maior probabilidade de apresentar obesidade.
Por isso, todas as nossas experiências e escolhas do nosso dia a dia (como fumar demais ou ser muito estressado no trabalho) podem não só influenciar em nosso estado físico e emocional, como também pode virar uma “herança” para nossos filhos. “Não sou especialista em epigenética, mas eu uso o conhecimento que estes estudiosos pesquisam para corroborar o que quero passar para meu público. Ela começou numa questão ligada à biologia, mas passa por várias áreas hoje. Mas, é importante ressaltar que, quando a gente fala de um ambiente sadio, nós não estamos falando de superproteção: é bom que existam cobranças, estimulações e limites. Um ambiente saudável não é um ambiente permissivo. Se os pais soubessem o quanto mimar prejudica, eles não fariam. Mas se os pais mimam, eles têm um problema neles. A criança não nasce mimada, é o ambiente que promove. As regras, o papo, tudo isso faz parte de mudanças, inclusive genética”, explica Adriana.
Um dos estudos mais conhecidos na área da epigenética é o da psiquiatra e professora da Escola de Medicina de Monte Sinai Rachel Yehuda, que abriu uma clínica em Nova York em 1992 para atender sobreviventes do Holocausto. Para a surpresa da médica, ela percebeu que muitos dos filhos das vítimas, nascidos anos depois do fim da Segunda Guerra, também apresentavam sintomas de estresse acima do comum, mesmo não tendo convivido com o sofrimento dos pais.
Outra pesquisa realizada foi na Universidade de Edimburgo, na Escócia, pelo professor de medicina molecular Jonathan Seckl. Experimentos com ratos mostraram que fêmeas grávidas expostas a hormônios reguladores do estresse geravam filhotes com respostas alteradas a estímulos violentos. Na prática, os filhotes de mães estressadas eram mais ansiosos. Seckl prosseguiu seu trabalho notou que os “netos” das ratas também apresentavam sinais de estresse. Para o pesquisador, a única explicação plausível é a de que os hormônios mexeram com alguns genes e que esse padrão foi transmitido pelo menos até a terceira geração de ratos.
Hoje, Rachel Yehuda e Jonathan Seckl estudam juntos as grávidas que presenciaram os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001. Até agora, as crianças nascidas apresentaram um nível de cortisona (hormônio ligado ao estresse) no sangue mais alto do que a média da população. Daqui a alguns anos eles pretendem examinar os filhos dessas crianças e avaliar se o mesmo acontecerá.
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