Publicado em 04/03/2018, às 07h14 por Rebecca Barreto
Sempre fui daquela que amava viajar sozinha. Sempre curti ficar horas olhando as pessoas na rua. E quanto mais diferente o lugar onde eu estava, mais fascinante tudo se mostrava. De Cambodia a Moçambique, cada ruga em rostos vividos, cada movimento de um caminhante, cada sacolinha de compras carregada, me instigavam intensamente. Acho que sempre fui uma grande observadora, não à toa, meu senso estético-observador me tornou designer e meu interesse por histórias, me tornou também psicanalista. E eu vejo muita conexão entre tudo isso.
Sou uma loira neta de japoneses. Uma Sansei de olhos verdes. Por precocidades e esquisitices da minha família, tive um avô japonês, um Vô-Drasto, que me criou até meus 6 anos quase que diariamente. Esse mesmo avô, tinha paixão pelo primor da caligrafia, e bolava para mim, com pena de nanquim, como seria minha assinatura quando eu ficasse adulta, e eu, ali na beira da mesa do seu barracão do fundo do quintal na Vila Mariana, ficava admirando aquele kanji ocidentalizado que hoje bombaria nos boards de Pinterest.
Ele também dizia que quando eu fizesse dezoito anos ele me levaria para o “japônn” e me daria um Miúra. Eu, ali menininha precoce, respondia do alto dos meus sete anos, que aos meus dezoito eu já estaria morando em Londres, e seria já casada com David Bowie, e que ele “não sabia é de nada, vovô”. Seu Massayose, virou senhor yoshe, que depois virou senhor josé, nos brasileirismos da vida. Hoje eu percebo o quanto eu gostaria de ter tido uma chance de levar esse Seu José de volta àquilo que ele vislumbrava para meus 18 anos.
Viajar, sempre foi mais que hotel, passeios e tickets de entradas em monumentos e museus. Sempre foi um mergulho na possibilidade de me adaptar, de me recriar, de me tornar alguém diferente. Sempre me dei muitos desafios imaginários durante minhas viagens: como seria, se instantaneamente eu tivesse que morar aqui? O que eu faria? como seria minha casa? como seria minha rotina? e meu trabalho? E mesmo tendo imaginado isso em Siem Reap, Atacama ou Minas Gerais, nunca nenhum lugar foi tão rico em diferenças para imaginar uma vida em Tóquio.
Nessa casa do meu avô japonês com avó mineira, comíamos por vezes, arroz, feijão e cubos de atum cru por cima como se fosse um Chirashi abrasileirado. Mesmo com tanta vivência japonesa, eu não sabia como conhecer esse lugar sonhado, seria tão “life-changing” para mim, que só conheci o Japão em 2006.
Cá estou eu, após uma mudança de continentes, morando em Singapura, com meus dois filhos que nunca sonharam em ter uma relação com a Asia nesse nível. Cá estou eu, tendo topado a mudança de olhos fechados, sem conhecer esse país que hoje vivo. E, após um ano e meio, senti-me emaranhada demais nas funções maternais que me tiraram da essência de quem eu conhecia como eu mesma. Um ano e meio, acompanhando todas as transformações de crianças acostumadas a Turma da Mônica virarem crianças experimentando Dumpling ou Tempeh.
Chegou meu aniversário. Meus 40 anos antes assustadores vieram em paz por ter rejuvenescido com a mudança de continentes, me sentindo completando novos 30 anos. Porém, um vazio em mim, precisava mesmo de um resgate à minha história, e um pulinho no Japão seria isso. Esse algo preenchedor dos buracos da alma rasgada pela rotina. E Tóquio foi a minha solução. Voltar mais uma vez, uma terceira vez, àquela miscelânea de cores, luzes e de gente.
Foram 7 dias distantes. De mochila, num apê de um designer surfista que achei no AirBnb no descolado canto de Shimokita-zawa, local mais trendsetter como o momento pedia. Sair cedinho e achar o canto preferido de smoothie de leite de aveia. Sentar e tomar um café num lugar qualquer só porque a senhoria que ali estava chamou-me a atenção pra eu puxar papo com ela. Ir para um parque diferente num dia de sol de inverno e sentar para fazer Yoga, e ficar horas observando uma excursão de crianças catando formigas no pé de um templo antigo. Ou ir até seu museu preferido, chegar ali e virar as costas porque nada te atraiu. Quanta liberdade é viajar sozinha. Tirar férias não só de trabalho, de marido, de rotina, e da família, e sim, tirar férias de ser mãe.
Entrei em mais de 50 brechós de roupas malucas. Voltei tossindo, com bronquite de tanta poeira histórica. Vesti roupas que me fizeram parecer backing vocal do Dee Lite ou de cantora substituta nas Frenéticas. E aos poucos, todas aquelas Rebequinhas estavam de volta, à tona, borbulhantes e felizes. Comprei casacos de couro com franjas coloridas, fiz sessões duplas de cinema com legendas em japonês, fiz aulas experimentais de pilates e yoga sem entender nada do que falavam, e, por fim, comi sushi deliberadamente mesmo sendo vegetariana. Sem filhos, sem marido, sem ligações sofridas, sem reuniões de trabalho ou nenhum compromisso, lá estava eu, ocupadíssima me reencontrando com várias de mim, andando numa rua estreita, cheias de portas pequenas.
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