Publicado em 10/11/2021, às 13h02 por Cecilia Troiano
O trecho acima vem das sábias palavras de Rubem Alves e muito nos provocam a pensar sobre nossa relação com nossos filhos. Quantas vezes já apagamos o fogo para que nada de ruim acontecesse com eles? Ao olhar para minha própria trajetória como mãe, apaguei, sim, muitos fogos da Beatriz e do Gabriel, meus filhos. Alguns apagariam quantas vezes fossem necessárias, outros, hoje olhando com distanciamento, deveria ter deixado por conta deles. Na ansiedade de resolver por eles, me precipitei, achando que estava agindo pelo bem deles.
Hoje já não tenho certeza. Por sorte e por competência deles, tornaram-se adultos, cresceram e me orgulham demais, superaram qualquer erro meu e conseguiram fazer o milho virar pipoca. Mas revisar depois o que deveríamos ter feito é como ser engenheiro de obra feita, facinho. Na hora do “vamos ver” é que a coisa se complica e não temos a maturidade e frieza para deixar o circo pegar fogo.
Numa breve exploração que fiz sobre as compreensões do fogo, encontro sempre uma ambiguidade no conceito, seja no cristianismo, no budismo ou na psicologia. Fogo como aquilo que purifica, renasce, constrói e, ao mesmo tempo, o que destrói, aniquila e extingue. Também enquanto escrevo me dou conta de quantos provérbios temos que envolvem o fogo, a maioria deles apontando alguma ameaça, intuição ou ousadia: “Com o fogo não se brinca”, “onde há fumaça, há fogo”, “fogo de palha”, entre outros. O interessante é que o saldo do fogo, mesmo que ele traga os dois polos, a vida e a morte, fica na maior parte das vezes mais apegado ao polo da destruição.
Bom, voltando às nossas vidas como pais e mães, acho que é um pouco isso o que acontece. Conscientemente ou não, vamos evitando que nossos filhos se queimem, ops, se frustrem, tenham que lidar com as brasas da vida. Pois é, no calor do momento, pais e mães adiam a possibilidade dos filhos experimentarem as dores da vida, as dificuldades, desde as menorzinhas até as grandonas.
A provocação que trago aqui é: será que uma queimadinha de vez em quando não é exatamente o que nossos filhos precisam para crescerem e amadurecerem? Minha resposta é um sonoro sim. Eu ponho minha mão no fogo de que essa é a única resposta possível caso queiramos ver nossos filhos crescerem com autonomia, segurança e confiantes de si. É fazendo eles passarem por essa transformação, de milho para pipoca que estaremos fazendo nosso papel de forma mais plena.
Não há crescimento sem dor, por mais difícil que seja para nós pais. Deixar eles se queimarem de forma amparada, claro, é o que precisamos proporcionar aos nossos filhos. Eles precisam e merecem isso de nós. Nunca é demais repetir a inspiração vinda de Rubens Alves, “quem não passa pelo fogo, fica do mesmo jeito, a vida inteira”. Se queremos transformação, que possamos ter coragem de permitir que nossos filhos virem milho de pipoca!
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