Publicado em 08/08/2013, às 21h00 por Tatiana Schunck
Essa noite eu sonhei que meu filho pegava uma aranha nas mãos e eu chorava muito sem saber se ele havia sido picado por ela. Eu conversava com as pessoas que estavam próximas, estávamos numa pequena festa. Eram vários ambientes e eu havia me ausentado por um instante do meu filho. De repente, ouvi o seu choro de longe, um choro breve como costuma ser na vida real. Eu corri para ele, o olhei com aquele efeito raio-x que as mães realmente têm e vi que estava tudo certo por fora. Aí eu descobri por uma voz do além que ele havia segurado nas mãos uma aranha, só isso. Eu fiquei um tempo em nenhum lugar, num espaço vazio que se organiza para entender o acontecimento.
Depois de uns segundos nessa etapa eu vi a caranguejeira nas mãos do moleque, quase maior que ele e fiquei mole no osso. Respirei fundo, me sentindo preocupada ao extremo e comecei a chorar. Com medo, com dor, com culpa… Ai que droga, como é ruim ficar culpada, no sonho então, ela assume proporções homéricas. Comecei a procurar possíveis picadas pelo corpinho do menino, mas ele estava normal, ria e se entusiasmava com a possibilidade de voltar à vida e continuar com suas explorações. Eu deixei, mas acordei com a questão: como deixar o filho viver? E eu costumo exercitar essa doação, pois convenhamos, é uma doação divina, é a dialética concreta com corpo e forma e ainda por cima, fala. Deixá-lo ir para a vida, para a sua vida. Mas e as aranhas caranguejeiras? E a picada possível? É um misto de liberdade e crença na vida, na potência da vida, nas escolhas da vida, e do outro lado (como o sentimento do sonho), fico estremecida a ponto fantasiar a criação da capa protetora de qualquer, mas qualquer coisa ruim, dolorosa, difícil e assustadora. Meu filho me ensina que uma aranha é algo tão curioso que dá vontade de por as mãos.
Eu começo a ver o mundo de um jeito que não tem perigo, de um jeito simples. Daí lembro-me que a adulta aqui sou eu e que devo ter olhos espertos, não desesperados, nem aprisionados, mas espertos. Eu sempre o imagino vivendo quando estou longe, imagino o que está sentindo e fazendo. Imagino-o se divertindo, caindo, andando, descobrindo, falando, sendo. Fico renovada com a possibilidade de ele viver as suas histórias e depois me contá-las. Isso me deixa segura de que a vida que desejo é essa: viver as minhas histórias. E a vida que o outro vive: também as suas historias. E depois as trocamos, na medida do desejado.
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