Ele: ter filhos grandes
No Natal perguntei “cadê meu presente?” e ela disse: “Vai chegar no seu e-mail à meia-noite”. Lá estava: “Esse ano eu decidi te dar algo digital, não tenho certeza se isso vai ter o mesmo valor para você, que tem para mim. Vou te enviar diariamente por cem dias, fotos nossas, pra lembrar de como fomos parceiros”. Eu respondi: “Receber e-mails diários por cem dias vai nos fazer ainda mais parceiros. Mesmo eu sendo um pai bobão e você uma adolescente”.
E pelos cem dias seguintes (na verdade, o e-mail que chegou hoje é o de número oitenta) ela me mandou fotos nossas. A gente na pracinha, na praia, na bicicleta, em casa, ela crescendo, eu envelhecendo. Depois de a gente ter filhos nunca mais sente só uma coisa. A alegria vem junto de saudade. A empolgação vem junto com cautela. O desapego vem sempre junto com desespero.
Ela vai fazer dezoito anos semana que vem. A menina que me transformou em pai. A menina com quem errei tantas vezes, como se erra sempre nas primeiras vezes. Coitados dos primeiros filhos, nossos laboratórios de teste. Perguntei: “O que você quer ganhar de aniversário de 18 anos?”. Ela disse: “Uma viagem”. Pensei: “Oh não, vai querer uma viagem com as amigas”. Ela disse: “Quero uma viagem só eu e você, como a gente fazia quando eu era pequena”.
E aqui estamos nós. Na nossa viagem para o passado. Um pai me perguntou: “Como você consegue manter proximidade com sua filha adolescente?”. Eu disse que, realmente, tem momentos difíceis. Mas falo com ela desde que estava na barriga da mãe. São dezoito anos juntos. Acho que isso ajuda.
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Ela: os critérios de avaliação
Minha avó costumava enunciar esta frase para consolar minha mãe quando éramos adolescentes. Ainda tenho uma criancinha em casa – ufa – mas minha adolescente virou “de maior”. Não chego a concordar com a vó Alzira, mas que filho grande dá trabalho de uma forma mais complexa, isso dá. Anita está fazendo faculdade, o que é ótimo. Anda animadíssima com as tarefas e os projetos. Vida de universitário é cheia de festa. Mesmo a Anita, com seu temperamento caseiro, “está com o pé que é um leque”, como (também) dizia minha vó.
Chega o final de semana e ela quer ir pra balada, pra barzinho e pra casa dos amigos. Eu era igualzinha. Lembro exatamente o quanto gostava de viver na rua. Então, quem sou eu para julgá-la? Sou uma mãe e ser mãe é se preocupar. É o que temos. No primeiro final de semana de “eventos”, alternei ser motorista com esperar ela chegar de carro de aplicativo com as amigas na madrugada. Nem dormi.
Minha vida acabou, meu sossego se foi, pensei. Na semana seguinte, eu torcendo pra chover, pra não ter show, festa ou aniversário. Eu queria dormir, sem acordar a cada meia hora com o coração aos saltos. Que nada, até numa “tourada” ela quis ir. Eu trabalho, tenho meu dinheiro, todo mundo vai… Ela tinha mil justificativas pra botar o nariz pra fora. E nem frio fez, poxa, Curitiba, você já foi melhor com as mães que não querem que os filhos saiam!
Nada convencia a meninota a ficar em casa. No domingo tivemos uma DR. Filha, eu não durmo, desse jeito vou precisar tomar remédio. Eu tinha virado uma tia velha. Esse dia chega pra todas. Felizmente ela conversou com a sua psicóloga e me trouxe soluções: combinamos que, daqui pra frente, a hora de chegar é inegociável, sempre alguma amiga volta junto pra dormir em nossa casa e o mais importante: ela me compartilha a localização a noite toda.
Nunca imaginei que eu seria essa mãe, que iria ficar olhando no celular pra ver onde a filha está, mas… A gente muda com o tempo. De fato, este foi o terceiro final de semana de festerê, mas com as novas regras – os combinados como falamos com os pequenos – e de fato, funcionou. Hoje é segunda-feira e não estou um caco, consegui dormir. E você aí achando que quando desfraldar, fica fácil; quando falar é mais simples, quando, quando, quando. Não tem quando, filho é sempre.
