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O trabalho da criança

Imagem O trabalho da criança

Publicado em 08/05/2011, às 21h00 por Redação Pais&Filhos


Brincando, o bebê elabora suas angústias mais profundas, como a separação da mãe. Para isso, ele não precisa de brinquedos sofisticados

Por Leonardo Posternak*, pai de Luciana e Thiago

Arnaldo Antunes escreveu uma música em que diz: “Criança não trabalha, criança dá trabalho.” Mas quando a criança brinca, ela trabalha, sim, e intensamente, do ponto de vista psíquico. O brincar é um dos facilitadores da construção do sujeito. As brincadeiras ajudam no esclarecimento das fantasias, na produção de simbolizações e na compreensão de aspectos gratificantes ou amedrontadores. Até uma brincadeira sem sentido aparente tem sempre um significado e uma representação. O valor do brinquedo não está naquilo que ele é; sua importância reside em ter uma função simbólica. Ao brincar, a criança se humaniza.

Desde a fase de bebê e durante o primeiro ano de vida, podemos observar várias brincadeiras. O bebê brinca de introduzir comida na boca e logo cuspi-la – e afirmo categoricamente que o filhote não é um “chatinho” mal educado. Ele simplesmente (se podemos considerar isso como algo simples) está compreendendo os conceitos: dentro de mim e fora de mim.

Logo aparecem os denominados “jogos de construir superfície” quando parece não existir contiguidade entre a criança e a mãe ou o cuidador. Por exemplo, quando a criança se besunta com papinhas, sem ter consciência, ela nos mostra que seu corpo é como uma colagem, como se fosse uma superfície contínua que representa a forte relação simbiótica entre o bebê e sua mãe.

Outro tipo de brincadeira é a do bebê beliscando a mãe, puxando os cabelos, tirando os óculos, ou enfiando seus dedinhos no nariz, na boca ou nas orelhas da “sofrida” mãe – parece querer perfurar o corpo dela, aninhar-se dentro. Repito que, nessa época, não há distinção entre fora e dentro, entre o interno e o externo, enfim, entre o bebê e sua mãe.

Logo que o corpo se torna uma unidade por meio do brincar, a criança dedica muito tempo do dia para se exercitar em jogos nos quais seu corpo equivale ao espaço. Ela tenta tirar e pôr tudo o que está nas gavetas, caixas e em seu maior objeto de desejo: a bolsa da mãe! Por não ter uma clara distinção dos diferentes volumes, teimosamente tenta encaixar objetos grandes em espaços pequenos. Também nessa etapa, a criança se atira brusca e perigosamente para trás quando está no colo, sem aviso prévio.

No limite

Existem também as brincadeiras “das bordas”, que expressam a paixão infantil pelas fronteiras ou limites. Exploram o equilíbrio e giram sem cessar, provocando vertigem. Além disso, gostam de espiar pelas frestas, tentam se enfiar embaixo de móveis, tem fixação por andar ou correr por bordas de piscina (cuidado!), empurram brinquedos para que caiam das mesas. Brincam de cair e dão muita risada, querem tocar o que não podem (tomadas, por exemplo) e entrar onde não devem.

Outra brincadeira típica é a que Freud aprendeu com seu neto e que denominou em alemão de “FORT”, que significa fora ou longe – a criança atirava seus brinquedos para longe e falava em sua linguagem incompleta a palavra “fort”, assim

fantasiava que seus brinquedos partiam, representando o estar longe, o que está fora da visão. O avô famoso e coruja descobriu que isso simbolizava a partida da mãe, e que a criança questiona e duvida, perguntando-se: “como ela pode se afastar de mim?” e “eu não sou tudo para ela?”

A seguir, acontecia o Fort -Da, sendo o significado de “fort” longe ou fora, e o de “da”, aqui está. Isso é denominado jogo do carretel. Consiste em um carretel com um fio amarrado. A criança atira o carretel embaixo de móveis ou objetos, perdendo-o de vista (FORT), mas logo o puxava de volta (DA). Desse jeito, completava-se a brincadeira: “está e não está” ou “desaparecer e reaparecer” ou “presença e ausência”. O simbolismo está implícito na representação do carretel como substituto da mãe. Assim, a criança deixa de chorar quando a mãe sai (desaparece): simplesmente ela brinca de “fort-da”. A mãe sempre volta, e a criança se torna dona da situação.

Calma, muita calma. Nossos filhos não têm um avô ou uma avó tão famoso como Freud, porém também brincam desse jeito. Equivalentes ao jogo do carretel, existem outros, como colocar e retirar da frente dos olhos um pano. O objetivo é o mesmo: estar/não estar/estar novamente. Eles também podem brincar de fechar os olhos e logo abri-los novamente, para que os objetos reapareçam. A imagem no espelho também tem esse objetivo.

Com essas e outras brincadeiras, a criança “nasce” para a linguagem e o seu desejo se humaniza. A encenação de uma situação dolorosa ou incompreensível, que se transforma em algo lúdico, acaba se sobrepondo à qualidade da lembrança. O “fazer de conta” diminui a angústia. As crianças se apropriam da situação e, por meio da repetição, elaboram seus medos provocados pela incompreensão. Por mais “de mentirinha” que seja uma brincadeira, esse é o único lugar onde a verdade pode ser enunciada.

*Dr Leonardo Posternak é pediatra, presidente do Instituto da Família (IFA) e nosso colunista.

Para saber mais

E Agora, O Que Fazer?, de Magdalena Ramos e Leonardo Posternak
Os autores dão dicas e orientações para casais grávidos e com recém-nascidos – sobre o desenvolvimento do bebê, a escolaridade, o brincar e os problemas do dia a dia.
Ed. Agora (www.gruposummus.com.br), R$57,90


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